quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

O principio do Cálvario da "Aurora", Janeiro de 1912

Portugal, Janeiro de 1912. A ausência do cumprimento das promessas feita pelo PRP (Partido Republicano) a par com o esvaziamento da Carbonária Portuguesa (já só se constituía como movimento anti-grevista de acção "musculada") faz aumentar a influência do movimento sindicalista por todo o País.
O Governo, já só quase exclusivamente interessado na distribuição de "poleiros" (Bernardino Machado ganha o apelido de "São Bernardino", nas ruas de Lisboa), deixa progressivamente o País entregue aos vários interesses económicos que povoam o território. Em Janeiro de 1912 dá-se o inevitável: o divórcio entre as massas operárias e a República consuma-se. O calvário da I República tem assim o seu ínicio e fim no 1º e único Governo de esquerda que existiu até à III República, o Governo de Domingues dos Santos (1924-1925), o último suspiro eleitoral da I República e o princípio do fim da aspiração a um Estado Democrático.

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Guarda Fiscal guarda as escadinhas do Duque (Lisboa) após o Governo
ter decretado a 30 de janeiro o estado de emergência,
entregando aCapital às "forças de segurança",
suspendendo as garantias e impondo o recolher obrigatório.

Em Évora a intenção do governador cívil, numa disputa entre lavradores e trabalhadores rurais (os lavradores recusam cumprir a tabela salarial previamente estabelecida e acordada com os seus assalariados) em que o governante toma o partido do patronato, leva os trabalhadores a declararem-se em greve. O chefe do distrito, para impedir que os trabalhadores reúnam, manda encerrar a sede da Associação dos Trabalhadores Rurais e ordena à G. N. R. e ao Exército que cerquem a cidade, não permitindo o acesso dos grevistas à capital.
As restantes associações operárias de Évora e de todo o distrito proclamam, em 13 de Janeiro, a Greve Geral, a que aderem mais de 20 000 trabalhadores dos dois sexos. Alarmado, o governador civil determina o encerramento das associações de classe que encabeçam a greve. Entretanto, os grevistas entram em Évora, ultrapassando as barreiras levantadas pela G. N. R. e pelo Exército, sem quaisquer incidentes. As ruas e as praças da cidade estão completamente ocupadas pelos trabalhadores. A prisão de alguns elementos mais activistas do movimento, ordenada pelo governador civil, torna a situação explosiva. A 24 de Janeiro, uma discussão entre grevistas e uma patrulha da G. N. R. provoca um morto e vários feridos. A 28, em face destes acontecimentos, a Federação Anarco-Sindicalista de Lisboa decide proclamar uma Greve Geral de solidariedade para com os trabalhadores da região de Évora.
Em Lisboa, Setúbal, Almada, Montijo e Moita a adesão à greve é quase total.
No dia 29, para evitar confrontos com as «forças da ordem, os trabalhadores recebem ordens para se concentrarem fora das zonas centrais de Lisboa; contudo, apesar das instruções, assinalam-se pequenas escaramuças com a Guarda Republicana e com a Polícia.

Na Moita, geram-se incidentes de grande violência, sendo morto o administrador do conselho. Em Lisboa, na noite de 29 e no decorrer de 30, rebentam conflitos entre militantes, a Polícia e a G. N. R., em que morrem vários grevistas e são feridos muitos outros.
O Governo, em face do deteriorar da situação, declara o «estado de sítio», «suspende as garantias constitucionais» e entrega a cidade ao Comando Militar. No dia 31, apesar de já ser conhecido o termo da «greve dos rurais», por terem sido reabertas as sedes das associações de Évora e restituídos à liberdade os activistas presos, o Exército prossegue as operações de limpeza na capital do País. Ao fim da tarde, dois Regimentos de Campanha, com artilharia, um «batalhão de voluntários», forças da GNR e da Polícia cercam a Casa Sindical (sede da Federação) e exigem a evacuação imediata do edifício, sob pena de o sujeitar ao fogo de artilharia, e a rendição de todos os que se encontram lá dentro. Os trabalhadores sitiados entregam-se sem resistência e, nessa mesma noite, mais de 600 homens e mulheres são conduzidos, sob aparatosa escolta da G.N.R. e do Exército de armas aperradas, para bordo do transporte Pêro de Alenquer e da Fragata D. Fernando, onde ficam presos nas piores condições de alojamento.

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Após o assalto à casa Sindical, forças do exército conduzem
sob prisão os manifestantes, que seriam encarcerados em
navio de guerra e no Forte de sacavém

A prova de força do movimento operário foi assim brutalmente esmagada pela intervenção das autoridades republicanas.

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